[NORONHA (Henrique de) — PEREGRINO (Estaquio) [Pseud.]. Exemplar // Politico de // Pedro // Unico no Nome, e // Rey 8.º // de Portugal // offericido // Ao Excelentissimo Senhor // Luis Alvres de Tavora Mar // ques de Tavora, e Conde de S. // Joam, Gentil Hom~e da Cama // ra do Principe nosso Senhor, // Governador, e Capitam // General da Provincia // de tras dos mõ // tes. // pello Autor Estachio Peregrino. [dim. aprox. 14,5×20,5 cm.] 98 ff. E.
Interessantíssimo manuscrito, cremos que dos finais do séc. XVII, cuidadosamente caligrafado, decorado com uma bonita cercadura na folha de frontispício com motivos florais.
A propósito desta obra, hoje atribuída a Frei Henrique de Noronha e impressa em 1723 na Off. de Pascoal da Silva diz Maria L. Machado de Sousa [Inês de Castro na Literatura Portuguesa, pág. 93 a 95]:
“O autor de ‘Exemplar Político. D. Pedro único no nome 8.° Rei de Portugal’, do qual há vários manuscritos apresentados sob nomes diversos, possivelmente os daqueles que os copiaram, foi Frei Henrique de Noronha, carmelita descalço, que morreu em 1660.
Segundo Inocêncio, o volume publicado em 1723 foi pouco apreciado, mas o grande número desses manuscritos, quase todos do século XVII (um deles com a data de 1670), parece apontar para um certo interesse que teria suscitado anteriormente. Dando como razões da escolha do assunto «a errada opinião, que teve o mundo contra este Príncipe, e a tirania execranda com que a inveja matou a sua Princesa inocente», o frade declara ao leitor que vai contar a história de Pedro e Inês como advertência aos príncipes, «que são os mais sujeitos aos juízos dos homens». E acrescenta: «Deixo algumas vezes aquela ordem que guiava a história pelos anos, porque não sou Cronista; faço elogios, e onde mais servem no intento, aí os ponho.» E assim se afasta da posição do historiador, embora utilize um assunto histórico, que subdivide em curtos capítulos que intitula de forma original ― «Tálamo», «Providência», «Inveja», «Ternura», «Benefício», «Mistério», «Sentimento», etc. Deles parte para longos Juízos, onde analisa e discute o sentir e o comportamento dos homens com base nas Escrituras. Entre eles se distingue o que trata dos conceitos de prisão e liberdade a propósito do suplício dos conselheiros. Importante é também aquele que trata da importância dos validos e das funestas consequências dos caminhos errados a que podem levar os reis. Fala da beleza de Inês, «único milagre de perfeição», da «fineza» do amor de Pedro do «mausoléu que ainda hoje admira, pelo magnífico», dos aspectos positivos da governação deste rei, que deixou saudades. Destaca-se mais nesta obra, a respeito da qual é difícil resistir à tentação de usar o termo «romance», o gosto pelos longos discursos, já sugerido na «Informação ao Leitor», e no facto de estar orientada para a forma de sermão, que é na realidade aquilo a que correspondem os juízos. São os mais importantes os discursos (orações) postos na boca de Inês, dirigidos um ao Rei e outro aos filhos, e o do Conde de Barcelos ao proclamar o casamento. Na sua visão do episódio há um detalhe particularmente interessante e inédito: o modo como encara o papel da Providência, que toma um aspecto próximo do fatalismo da tragédia antiga. O lado moral da história está bem defendido, pois que Pedro, embora quando já tinha filhos dela, a «recebeu, porém secretamente. Não se diminuiu o favor por acautelado; e então cresce com firmeza, quando se comunica com seguridade». Mas o autor parece não compreender como foi possível que a inveja pudesse destruir aquele amor abençoado e exprime-se desta maneira: «Deixa Inês a pátria e não alcança se para assistir a Constança, como a Rainha, se para acompanhá-la como a sucessora: não adverte se para cortejar a esposa de Pedro, se para a ser de Pedro. Não soube Inês esta futuridade, dispô-la a seu modo a providência.»
O ‘Exemplar Político’ é realmente uma obra curiosa, que merece um estudo mais completo, pois é um caso insólito na nossa literatura. (…)”.
O exemplar que agora procuramos descrever, em nome de ‘Estaquio Peregrino’ é dedicado a “Luis Alvres de Tavora Marques de Tavora, e Conde de S. Joam, (…) Governador, e Capitam General da Provincia de tras dos mõtes” [1.º Marquês de Távora [1634-?], filho de António Luís de Távora [c.1620-1653, 2.º Conde de São João da Pesqueira].
Bonita encadernação da época, em carneira, adornada a seco com uma larga cercadura com graciosos entrelaçamentos, rematados nas margens com filetes triplos e ao centro, também com três filetes formam três rectângulos.
Na folha de frontispício vem manuscrito “Da livraria do Coll.º de Stª Rita de Coimbra”.
O exemplar apresenta dois carimbos de posse da “Quinta da Lágrimas – Coimbra – M. Osorio”, sendo por isso o exemplar que pertenceu ao Palácio oitocentista mandado construir pela família Osório Cabral de Castro depois de ter sido alienada a “Quinta do Pombal”, onde ainda hoje se conserva a famosa ‘Fonte das Lágrimas’, cantada por Luís de Camões nos ‘Lusíadas’ em memória das lágrimas vertidas por Inês de Castro.