SARAIVA (Arnaldo).- O SOTAQUE DO PORTO. Fotografias de Duarte Belo. Edições Afrontamento. [Porto. 1996]. In-4.º de 140-VI págs. B.
"(…) Eu já ouvira falar do Mercado da Ribeira, mas não o imaginava assim, mais sórdido e apinhado do que o de uma vilória do interior ou do que o de S. José do Recife, cujas ruas e casas chegam a lembrar as do Porto, como lembrou Veiga de Oliveira. Ao lado e debaixo das arcadas, voltando as costas ao rio que, disse o Conde d’Aurora, o burguês tripeiro odeia como o alfacinha odeia o Tejo, amontoando-se tendas e barracas, bem como frágeis e deselegantes do que as de agora, onde confusamente se vendiam louças, têxteis, brinquedos, peixes, bolos e hortaliça, cassetes, flores, plásticos, sementes, ferragens, bebidas, peixes, bolos e frutos.
"Avancei como pude, aos ziguezagues, sem poder evitar pisadelas e cotoveladas, maus cheiros e poças de água. E estava junto de uma pequena banca de laranjas, à guarda de uma menina de uns dez anos, quando passou um garoto que parecia saído do ‘Aniki-Bobó’ (do filme, que o bar ainda não existia), e que deitou sem querer duas ou três laranjas ao chão. A menina apanhou logo uma e ameaçou atirá-las à cabeça do gaiato, enquanto gritava alto e bom som. «Olha que te fuado! Olha que te fuado».
"Esta cena bastou para me fazer ver a força do sotaque do Porto, que extensamente apreciaria em conversas ou gritos ouvidos nos jardins da Cordoaria, ou no Bolhão ou no Estádio das Antas ou nas ruas. (…)" Edição executada muito esmeradamente e ilustrada com fotografias de invulgar e sóbrio bom gosto.