Num palácio do Bairro Alto, mais um leilão de livros. Não se trata desta feita do desfazer de uma biblioteca por morte do seu possuidor e pressa dos herdeiros em cobrar-lhe a parte, mas tão-somente aquele que, muito em vida, se desfaz de uns quantos milheiros de muito interessantes obras porque, diz, «o embaraço e a saciedade do nosso Jacinto do 202, que no meio da floresta dos seus livros, não sabia que ler, longe de ser anedota, é um facto…Só com o imprescindível se pode ler, reler e tresler, com proveito, pois o excessivo força-nos a ler apressadamente». A opinião é, como se disse, do próprio dono da biblioteca agora em almoeda, o artista ex-librista e bibliófilo Aulo-Gélio Severino Godinho.
A venda, repartida por três fases, prolongar-se-á até meados de Novembro. Iniciou-se no passado dia 16 e prosseguiu até ao dia 20, retomando-se de 30 de outubro a 2 de Novembro e de 13 a 16 do mesmo mês. Na primeira fase agora realizada destacaram-se: 42 lotes com obras de Garrett, que incluíam várias primeiras edições nomeadamente a do livro impresso em Londres Da Educação; 14 lotes de Rafael Bordalo Pinheiro, onde se destacavam uma colecção, infelizmente falta alguns números, do António Maria, o Álbum de Caricaturas e os 39 números do Álbum das Glórias; 18 lotes com obras de Almada Negreiros, onde nem faltava um Manifesto Anti-Dantas e o raro fascículo Mito-Alegoria-Símbolo; 37 lotes de obras de Bocage, incluindo a sua primeira obra impressa, a Elegia consagrada a D. José Tomás de Menezes (1790): 45 obras (livros e opúsculos) aparecidas no âmbito da famosa polémica «Bom Senso e Bom Gosto»; 82 lotes com obras de Camões, em edições portuguesas e estrangeiras, e a importante – sobretudo por motivos bibliográficos – obra de John Adamson, em dois volumes, sobre o épico: Memoirs of the Life Writings of Luís de Camões (Londres, 1820); e uma «Camiliana» repartida por um lote de 24 livros e folhetos sobre Camilo e 187 lotes com obras do romancista, onde não faltam numerosas primeiras edições, incluindo a rara do Amor de Perdição (1862).
Na segunda parte desta importante almoeda, que terá lugar nos finais deste mês, o destaque vai para obras de Eça de Queiroz, Mário de Sá Carneiro, António Nobre e José Agostinho de Macedo, este com 33 lotes de obras suas. E também uma curiosidade: o manuscrito completo do romance Amor e Mulher de Carlos Malheiro Dias, sobre o «Setembrismo» e que só recentemente se editou na sua versão integral. Juntas, 160 páginas impressas em 1904, numa tentativa de edição não conseguida, nas quais o autor fez de seu próprio punho numerosas emendas.
E, finalmente, na terceira fase a realizar em meados de Novembro, as estrelas serão, entre outros, Antero de Quental (39 lotes onde abundam algumas peças raras e muitas primeiras edições), José Régio, António Pedro (quase toda a obra poética), Mário de Sá-Carneiro, incluindo as primeiras edições de Princípio (1912); Dispersão (1914), Confissão de Lúcio (1914) e Céu em Fogo (1915), e, obviamente, num tão grande conjunto de autores portugueses, Fernando Pessoa. E, deste, também a vedeta dos mais recentes catálogos e leilões: a primeira edição da Mensagem, desta feita encadernada mas sem as capas da brochura.
Esta muito variada e curiosa almoeda, onde além dos muitos poetas e prosadores portugueses se destacam os desenhadores humoristas, inclui também numerosas colecções completas de revistas importantes, onde não falta, sequer, A Ilustração de Mariano Pina (Paris, 1884-1891).
O leilão que, como dissemos, se prolongará até 16 de Novembro, realiza-se sob organização dos leiloeiros Soares & Mendonça, no 1. totolotek zaklady sportowe º andar do Palácio Ficalho, no Bairro Alto. gry hazardowe darmowe
Destaque-se, a finalizar, que esta importante almoeda está descrita num catálogo de 528 páginas, elaborado por Manuel Ferreira com o profissionalismo e a competência a que este alfarrabista já nos habituou.