CABRAL (António) [1863-1956].— CARTAS DE EL-REI D. CARLOS A JOSÉ LUCIANO DE CASTRO. Um grande rei.- Um notavel estadista.- Memorias politicas. Lisboa. Portugal-Brasil. [S.d]. In-8.º de 299-V págs. B.
“Neste seu recente livro, publica o sr. Antonio Cabral 128 cartas do rei D. Carlos I a José Luciano de Castro. No prefacio traça o perfil do signatario e do destinatario. Esse prefacio é o depoimento bem informado de quem foi jornalista, parlamentar, ministro e intimo de José Luciano de Castro, chefe do partido progressista. É um depoimento político, mas é tambem uma peça historica como tudo que ministra noticias sobre D. Carlos I, grande figura da moderna historia portuguesa pelos serviços que á patria prestou, pela sua personalidade superior e pelo seu martyrio. Da leitura serena do livro o estadista não sahe augmentado. José Luciano, que serviu quatro monarchas, D. Pedro V, D. Luiz I, D. Carlos I e D. Manuel II, na sua carreira de meio seculo, nunca mostrou ser um estadista de largos horisontes. Era um chefe de partido, habilidoso e disciplinador, sabia conhecer os homens nas suas fraquezas melhor que nas suas superioridades e com ellas jogava, e sabia conservar o poder a uma temperatura media. A sua preparação espiritual era unilateralmente juridica, e como jurisconsulto é que deu as suas melhores provas. Não soube retirar-se a tempo; velho, quasi cego, paralytico das pernas, ainda assim mantinha a chefia do partido e presidia ao governo, em casa, numa cadeira, com um gato ronronando aos pés.
“Sobre o rei, documentam as cartas a sua frequente intervenção nos negocios politicos, o seu tacto e a sua delicadeza, e dão-nos alguns elementos de interesse sobre a sua situação diplomatica. É sabido que a nossa politica externa foi por elle dirigida com iniciativas brilhantes.
“A sua contribuição mais importante foi, por certo, o restabelecimento da alliança ingleza e a defeza das colonias, especialmente auctorizada nos coevos triunphos militares. Foi seu collaborador nesses altos emprehendimentos o Marquez de Soveral, nosso ministro em Londres e amigo pessoal do rei Eduardo VII. Algumas das cartas mostram a acção do rei acêrca do accôrdo anglo-liso sobre a entrada dos ingleses no Transvaal, através de Moçambique, o que lhes facilitou grandemente a sua acção militar contra os boers. Com o activo desse serviço, o rei obteve a assignatura do tratado de Winsor, de 1903, que de certo modo annulava o tratado secreto anglo-allemão de 1898, respeitante ás colonias portuguesas. Sôbre a sympathia das côrtes de Londres, Roma e Madrid pelo rei tambem ha noticias apreciaveis nas cartas, em geral muito breves e familiares. Caçador, lavrador, amador de viagens, tudo deixava quando os negocios publicos o exigiam: «o serviço está antes de qualquer coisa para mim».
“Foi um excellente serviço que o sr. Conselheiro Antonio Cabral prestou, com o seu livro, á apreciação do soberano e do estadista.” [Fidelino de Figueiredo]. [’in’ REVISTA DE HISTORIA, 1926 [n.º 57 a 60, Ano XV]