FERREIRA (Manuel) [Alfarrabista].— CATÁLOGO DA BIBLIOTECA PERTENCENTE AO BIBLIÓFILO E ARTISTA EX-LIBRISTA AULO-GÉLIO SEVERINO GODINHO. Soares & Mendonça, Lda. Lisboa. 1989. In-4º de IV-528 págs. B.
Catálogo da importante biblioteca que pertenceu ao exigente bibliófilo e artista ex-librista Aulo-Gélio Severino Godinho, biblioteca especialmente constituída por literatura dos séculos XIX e XX, particularmente bem representada por Camões, Garrett, José Agostinho de Macedo, Bocage, Antero, Camilo e Rafael Bordalo Pinheiro; arte, história, revistas, olisiponense, livros ilustrados e estrangeiros sobre Portugal, numismática, medalhística, etc.
Do interessantíssimo prefácio de Aulo-Gélio Severino Godinho transcrevemos: “Quando o nosso bom Amigo Manuel Ferreira nos sugeriu a elaboração de um texto para anteceder o presente catálogo, afigurou-se-nos a ideia descabida e pretensiosa. Tanto quanto nos lembramos, não é vulgar nem curial que seja o dono a falar da almoeda dos seus livros… Pensando porém maduramente, considerámos que pior seria transferir a incumbência, pensando quão fastidioso é o encargo de repisar factos comuns à circunstância, como é o destaque de meia duzia de títulos sonantes, pela raridade ou pela curiosidade, o salientar de particularidades, concorrentes nesta ou naquela obra, sobejamente conhecidas (…).
“ (…) É do conhecimento generalizado que são dois os motivos que em princípio determinam os leilões de livros. Partilhas, por falecimento do proprietário ou problemas económicos decorrentes dos caprichos da fortuna.
“Não sendo felizmente nenhum destes o vector do presente leilão, qual então o motivo? O volume que o acervo atingiu no decorrer de mais de meio século; a tarefa de o cuidar, de dia para dia mais pesada e, finalmente, a apreensão quanto ao seu destino, após a inevitável saída do palco da vida. (…)
“Recordo muitas vezes o meu saudoso Amigo Alfredo Lucas Cabral, que foi dos maiores coleccionadores “Bordalianos”, nas suas horas de apreensão, de desânimo e de desgosto, quanto ao destino do seu precioso museu. Em especial as faianças, conjunto impressionante pelo número e qualidade das peças, seria impensável dispersa-las… Impossível também deixar aos filhos a responsabilidade e o pesado encargo de manter o conjunto. Conseguiu ainda em vida vende-las ao Estado, ainda que por preço praticamente simbólico, o que foi um bem para ele e para todos nós, independentemente do abalo sentimental que a separação lhe provocou. (…)
“É assim, de forma lenta mas determinada, que nos mentalizamos para uma decisão como esta. A longa preparação faz com que seja menos dolorosa e o mais curioso é que as pequenas bibliotecas que reservamos para o uso e para o gozo, como que adquirem um valor diferente, mais aconchegadas e mais íntimas, talvez porque sabemos que os livros que vamos manter vão acompanhar-nos até ao fim, indispensáveis, consultados, e como o seu número não incomoda, podem ser mais tarde, para os nossos, o núcleo de outra grande biblioteca, como aquela a que pertenceram. (…)”.